quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Porcão

Artigo: Walter Monteiro

“Porcão” ganhou esse apelido ao ser visto debruçado no tonel de lixo, do restaurante Sal da Terra, catando resto de comida para os cachorros. Assim dizia.


A primeira vez que o chamaram de “porcão” foi a turma do Eliziário, na porta dos fundos da escola. Não viu quem foi, mas correu atrás de um deles, sem conseguir pega-lo. Depois disso, sempre se afastava ao ver alunos conversando, mesmo assim, de vez em quando, ouvia alguém gritar:

- “porcão”!

Disfarçava e continuava andando, fingindo não ser com ele, apenas olhava para um dos seus “viralatas” e dizia:

- Acho que é contigo…

Certa manhã, fuçando de novo o tonel, falava sozinho:

- Por isso gosto do Uilton Viana, realmente é o melhor político de Maricá, mais bonito e se não fosse o seu governo criar o hábito do lixo apodrecer na rua, hoje não sobraria nada pra mim.

Na mesma calçada, saindo do Bradesco, vinha Vovó Matilde, uma idosa extrovertida, do grupo de dança da terceira idade. Antigamente era fã do Ricardo Queiroz, agora, com a casaca virada, elogia o Quaquá. Passava exatamente na hora em que “porcão” pensava em voz alta:

- Só esse lance do lixo, deixou o Uilton como o melhor prefeito da cidade…

A velhinha achou o assunto interessante e parou para ouvi-lo:

- Ainda não apareceu prefeito melhor do que o Uilton!

Vovó, metida à porta-voz do atual prefeito, tocou-lhe com o dedinho no ombro e disse:

– Escuta meu filho… Não sei quem é esse Uilton, mas seja lá quem for, garanto não ser melhor do que o “meu” Quaquá!

“Porcão” retirou a cabeça de dentro do tonel e meio fedorento, replicou:

- Escuta aqui, minha senhora, eu sei quem é o “seu Quaquá”, até votei nele… Mas não é melhor do que o “meu” Uilton, ta?

Matilde, nos quase noventa anos, levantou as sobrancelhas e cheia de malícia, disse:

- Hummmmm… “Meu Uilton” heimm…

- Sim, “meu Uilton” mesmo! E tem mais: seu prefeito precisa comer muito feijão e arroz pra ser igual ao Uilton!

- Feijão com arroz, meu jovem… Se você não sabe, em poucos meses Quaquá já cumpriu quase tudo que prometeu na campanha eleitoral.

“Porcão”, com o traseiro no alto e a cabeça no tonel, respondeu lá de dentro com voz abafada, tipo trombone:

- Isso não consta no meu calendário… Mas diz alguma coisa que ele já fez?

Vovó Matilde revirou os olhinhos e falou bem séria:

Olha meu filho… Na sua plataforma, Quaquá prometeu quebrar a empresa Amparo e está quase conseguindo.

Surpreso, “porcão” colocou as pernas no chão e retirou o corpo do tonel, com meio pedaço de coxinha na boca:

- Não to entendendo… Como ele está quebrando a empresa?

- Muito simples: Ele não conserta os buracos das ruas e os ônibus aos poucos vão quebrando, com o tempo pede falência e outras empresas virão circular no município.

- Muito inteligente vovó… Mas o “meu Uilton” não faria nada disso… E se pensar bem, o “seu Quaquá” pode até destruir a empresa, mas quebra também os carros e motos da população e, o que sobra, a PM prende e deposita em Itaboraí. Agora eu pergunto: - É bonito isso?

- Pode não ser bonito – Disse vovó Matilde: - Mas faz parte do “choque de ordem”, importado da prefeitura do Rio.

Choque de ordem… Choque de ordem… Repetia “porcão” e depois completou: - choque de ordem ele devia dar na prefeitura!

No calor da discussão, eles não perceberam as pessoas ao redor; o careca do bar acenava chamando outros, o taxista reduziu para olhar, algumas senhoras pararam e sorriam e um homem gordo, de rabinho de cavalo, perguntou:

- Por que na prefeitura, o que tem lá de errado?

Porcão estranhou a voz e saiu de dentro do tonel.

- Quem é o senhor?
- Sou morador novo na cidade, mas o assunto me interessa:

- Bem… Se o senhor é novo na cidade merece saber – E, cheio de autoridade, explicou: - Ta tudo errado na prefeitura! Ninguém sabe nada! Bagunça total! Trem da alegria e muita gente de fora!

Vovó, preocupada com a imagem de Quaquá, o interrompeu, justificando:

- Ora meu filho… O que tem isso demais! A prefeitura agora é dele e ele faz o que bem quiser!

“Porcão” terminou o trabalho, colocou as sacolas nas costas, chamou os cachorros e saiu em direção à praça, falando em voz alta:

- Dele nada! É do povo!

Vovó Matilde visivelmente irritada gritou, antes de ele dobrar a esquina:

- Vai… Vai… Seu porcão maledicente! “Biba” enrustido! Com sua língua-de-trapos, “meu Quaquá” é capaz de não se reeleger!

- Que se dane, não quero que se reeleja mesmo! Para provocar ainda mais a vózinha, “porcão” caminhou pela praça, lembrando as promessas de Quaquá:

- Cadê a rodoviária na estrada que prometeu? Os milhões do Lula pra Maricá? E as vans circulando na cidade? Onde estão as casas populares? E as creches comunitárias?

Cadê a recuperação do rio mumbuca? E esse tal de banco municipal?

Indo atrás dele, até os viralatas reclamavam:

- Au, au… Au, au…

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